Na manhã desta terça-feira (10), o cantor e compositor pernambucano Arto Soares, radicado em São Paulo, revelou, através da sua página no Instagram, as diversas vezes que sofreu com a xenofobia e o racismo, ao sair da cidade onde passou a maior parte da infância e adolescência, no sertão do interior do nordeste. Em texto, o artista esclarece alguns fatos e fala sobre o preconceito, que ainda é muito forte no Brasil.
“Venho aqui, por meio do meu perfil do Instagram, relatar alguns fatos que vem ocorrendo constantemente no meu dia-a-dia. Acredito ser fundamental jogar luz em algumas questões complexas, para que os mesmos problemas não venham a se repetir com mais e mais pessoas, sejam elas artistas ou não. O fato, que eu julgo ser mais do que delicado, é que há anos venho sofrendo com o problema da xenofobia (ocorrida, no meu caso, quando saí de uma cidade pequena para a capital, isto é, de Mossoró/RN para Natal/RN) e com o racismo estrutural (que ocorre quando a pessoa sofre desvantagens – e não igualdade – perante algumas oportunidades, em decorrência da cor da pele), acontecimentos capazes de ferir a alma de qualquer ser humano. Dentre as situações que já vivenciei, posso citar, por exemplo, que pertencendo a um grupo de nove pessoas (eu era o único pardo em meio a oito brancos), fui o único a ser revistado pela polícia militar de São Paulo, cidade onde resido atualmente. Coisas desse tipo não acontecem poucas vezes e sim de modo incontável, onde nem a mais perfeita memória seria capaz de tudo recordar. Existe um racismo árdego enraizado na sociedade brasileira, que não é novidade pra ninguém.
Voltando um pouco no tempo – há mais ou menos seis anos, na cidade de Natal/RN, onde morei por um ano -, depois de conseguir gravar o meu primeiro álbum, ganhar prêmios, angariar fãs e tocar em grandes festivais, perdi as contas de quantas vezes cheguei em casa e encontrei a minha irmã mais nova chorando, dizendo que a imprensa local havia criado mais uma fake news a meu respeito. Sair de uma cidade pequena para uma capital não é nada fácil, uma infinidade de pessoas já passou ou ainda passa por isso. Assim, tentaram me difamar a todo custo, taxando-me de maconheiro, petralha, mortadela, racista, drogado, agressor, dentre outras coisas absurdas, pejorativas e falsas, diga-se de passagem. Ações alheias, que a despeito das causas, tentavam impedir que eu avançasse na minha carreira de músico. Me senti brutalmente atacado e perseguido pelo ódio e pelo fascismo, já que os fascistas creem numa hierarquia social natural e no domínio das elites. É como diz genialmente a música do mestre Criolo “Uns preferem morrer ao ver o preto vencer…”. No entanto, como consequências das calúnias que sofri, ganhei diversos processos, melhor dizendo, recebi sentenças favoráveis a mim e que estão devidamente guardadas para comprovação.
A perseguição às “minorias”, é sabido, não se restringe a cor da pele, e reveste, no Brasil, a perseguição às pessoas do nordeste, às mulheres, aos homossexuais, indígenas, entre outros grupos. Todos nós precisamos aprender de uma vez por todas, para ontem, que vivemos num país potencialmente racista, machista, xenofóbico e homofóbico. Onde quem é favorecido por essa lógica perversa e imbecil não vai querer abrir mão dos seus privilégios, mas nem fudendo. Não busco e nem quero de maneira alguma, com esse texto, ocupar o lugar de fala de pessoas que tem a pele mais escura que a minha. Ou seja, negras, e não pardas, como eu. Imagino que se, pra mim, que retenho a cor parda, as coisas se tornam tão mais difíceis, para o negro brasileiro isso é agravado ainda mais. Sinto a necessidade de esclarecer, com afinco, a natureza desses problemas pelos quais tenho passado de modo contínuo. E sinto literalmente na pele, desde sempre, o que é sofrer com a xenofobia e com o racismo estrutural no Brasil. Sobre os acontecimentos que coloquei em evidência nesse texto, eles não configuram nem um por cento de tudo que passo no meu dia-a-dia, o que me faz refletir sobre algumas questões: Até quando vão perseguir as minorias? Até quando irão desmerecer as minorias, munidos de toda a injustiça possível? Ficaremos de mãos atadas? Até quando? E nós, brasileiros, o que faremos? Precisamos prover de mais empatia para com o próximo, e continuar expondo o que se passa, nos manisfestar e contestar essa cultura com mais frequência.”
Em seu vídeo mais recente, Arto Soares interpreta “Brassia”, música de sua autoria. Confira abaixo:
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